Entrevista com Paulo Dutra

Entrevista com Paulo Dutra

Por Ângela Prestes e Camila Guedes 

No comando de um dos maiores eventos de Passo Fundo, Paulo Dutra ainda se emociona com quem ajudou a construir o Festival Internacional de Folclore e hoje não está mais aqui.

Em uma conversa entre a correria no agora chamado Casarão da Cultura, o coordenador do festival conta sobre o sentimento de ver a festa da cultura acontecendo de novo, depois de uma pausa de 4 anos, e relembra os bons momentos que viveu ao longo de 20 anos de festival.

Nexjor – Qual é a sensação de ver o festival acontecendo depois de 4 anos? Ver o público se envolvendo, ver Passo Fundo se envolvendo?

Paulo Dutra -Nós estamos envolvidos com o festival há mais de um ano. O trabalho aparece, realmente, agora, durante a realização, mas já faz tempo que estamos nesse clima, com os voluntários, que são 140, fazendo reuniões semanais aos domingos à tarde e preparando o festival, mantendo todos os contatos. São muitos detalhes, mas é grande a satisfação de ver a reação da comunidade, essa ânsia que ela tem de ver o festival acontecendo. A comunidade tomou o festival como seu, e isso se sente nas ruas, nos shoppings, aqui no Casarão da Cultura. Essa satisfação que nós, voluntários, sentimos é muito grande, como o resultado de todo o trabalho e, principalmente, o assédio das pessoas, essa ânsia que a comunidade tem de ver, de ouvir outros idiomas, de conhecer a cultura, tirar uma foto, pedir um autógrafo e de vir assistir aos grupos.

Nexjor – Como é feito o contato com os grupos? Como vocês fazem para escolher os países que vêm?

Paulo Dutra – É através do Cioff, que é o Conselho Internacional de Organização de Festivais Folclóricos, que tem relações formais com a Unesco. Nós temos representações em mais de 80 países. No caso do Brasil, nossa sede nacional é em Pernambuco, na cidade de Caruaru, e cada estado tem uma sede estadual. No Rio Grande do Sul, somos nós, em Passo Fundo.  Os convites vão para os representantes desse conselho nos países ou nos estados, e eles escolhem os grupos. A partir daí, a gente começa a manter os contatos e as negociações que, aliás, são inúmeras. Tem grupos que, às vezes, a gente mantém mais de 30, 40 contatos para acertar, porque nós temos que acertar a vida das pessoas durante todo esse tempo aqui: é saúde, alimentação, transporte interno, porque a passagem de vinda do país ou do estado deles é por conta do grupo convidado, essa é uma das regras do festival. As negociações começam, mais ou menos, um ano e meio antes, porque os grupos têm que se articular, eles precisam de apoios, como os nossos grupos quando vão pra fora. A escolha se dá no momento em que vem o material do grupo, a gente examina o material, vê se é aquilo que a gente realmente quer e inicia o convite oficial.

Nexjor – São 20 anos de festival. Quais foram as principais mudanças dos primeiros festivais até hoje?

Paulo Dutra - São mudanças muito radicais. No primeiro festival nosso escritório era no porta-malas de um carro. Os contatos eram por correio, as fotos, o material todo, as fitas cassete vinham pelo correio. O contato era muito mais demorado. Os mais rápidos eram por fax, porque não existia essa comunicação rápida da internet. A outra mudança foi a ansiedade que nós tínhamos antes do primeiro festival de conseguir trazer para a comunidade, de pedir para eles aquilo que nós gostaríamos que eles fizessem para receber os grupos. O grupo principal da diretoria já viajou para muitos festivais, alguns já visitaram mais de 50 festivais no mundo todo e conseguiram constatar umas coisas como: “eu, estando lá, como gostaria de me sentir, que fizessem por mim, o que faria eu me sentir melhor para fazer um bom trabalho no outro país.” Essas experiências nós trouxemos para o nosso festival, e a gente conseguiu concretizar isso, tanto de passar para a comunidade o que a gente gostaria que ela fizesse, quanto a receptividade dos grupos, e o resultado está, principalmente, no que se está vendo nos jornais que entrevistaram os grupos. Eles mostraram essa satisfação com a questão da pontualidade, da organização, eles não têm estresse nenhum. O envolvimento dos voluntários faz com que o festival tenha este resultado.

A organização é fato primordial no festival. Nós já participamos de muitos e, muitas vezes, eles deixam para organizar depois que os grupos chegam. Aí não existe organização, é muito difícil, causa estresse e acaba não dando o resultado do trabalho, nem há uma integração com a comunidade como tem aqui em Passo Fundo.

Nexjor – Já existe um planejamento para o próximo festival? Qual é a expectativa?

Paulo Dutra - Nós vamos esperar terminar esse. Depois faremos as reuniões de avaliação com todos os voluntários e, a partir daí, com esses resultados, é que a gente reprograma algumas coisas que não deram certo e começa a pensar em manter contato para os próximos. Mas uma coisa bem salutar, e que nós queremos que aconteça, é a renovação das lideranças dentro do grupo de trabalho, porque ninguém é perene e tem muitos voluntários que realmente são líderes natos, que conhecem e têm capacidade. Nós estamos até forçando a barra para que alguém comece a assumir. Nós temos a diretoria central, os voluntários de todas as coordenadorias que são 18 comissões; então, acho que alguém tem que começar a assumir mais a liderança total dos trabalhos aqui.

Nexjor – Existe uma lembrança marcante de algum dos festivais? Algo que aconteceu e te marcou?

Paulo Dutra - Aconteceram tantas coisas boas durante todos esses períodos, como também coisas que não foram tão agradáveis. Uma lembrança não tão agradável, e que gera uma saudade muito grande, é daquelas pessoas que começaram conosco e já se foram. Os que foram fundadores, como é o caso da jornalista Maria Fátima Trombini, de O Nacional, da Angélica Weissheimer, da RBS, O Rogério Kurek, que era um dos músicos, o Sérgio Gradaschi, que se foi este ano e o Jorge Barbosa, todos bastante jovens. Há muitas lembranças boas também dos trabalhos que eles deixaram, do contato que a gente tinha e os voluntários que estão trabalhando. Causam uma espécie de furor na gente, porque eles também gostam da coisa e um entusiasma o outro a continuar o trabalho. As lembranças mais interessantes foram desde o primeiro festival, ele era mais diversificado nos bairros, mas gerava um custo maior. Nós íamos até os CTGs, até as escolas, mas aí tem que planejar toda a sonorização, o ambiente e tudo isso gera custos. Então, nós optamos por trazer todos os grupos até aqui, mas aqueles momentos eram muito interessantes, quando a comunidade se reunia, era um grupo menor. Essa é uma das lembranças boas, mas a maior é a integração com a comunidade, porque isso surpreende no mundo. E só quem vai para outros festivais e vê. Por exemplo, os europeus vão, lotam os auditórios, mas eles não têm o calor nosso, o calor brasileiro de receber. Aqui as pessoas têm esse contato, elas querem tocar, querem saber como é a roupa, querem ouvir a sonoridade do idioma. Então, a partir dessa ânsia da comunidade também surgiu uma outra comissão, que é a de oficinas de conversação, porque nós descobrimos muitas etnias em Passo Fundo e muitas pessoas que falam outros idiomas, os mais variados possíveis. Então, tem uma oficina só pra isso, um momento em que eles vão conversar, ou no idioma do grupo ou em português. É o momento em que eles vão discutir, vão expor a sua cultura e, ao mesmo tempo, ouvir a nossa. Essa troca de experiência, principalmente com os estudantes, é muito gratificante.


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Redação Nexjor

Núcleo Experimental de Jornalismo da AGECOM-UPF

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